quarta-feira, 17 de abril de 2013

"PRETTY WOMAN" – ROY ORBISON


O riff inicial de “Pretty Woman” é o mais marcante do rock ‘n’ roll e é impossível não se deixar contagiar pelo envolvente e trepidante andamento da canção. E mais que em qualquer outra música cantada por Roy Orbison ele está radiante e mais feliz que nunca. Rei dos melodramas soturnos e tristes que foram a marca maior de sua carreira como cantor, Orbison fala em “Pretty Woman” de uma mulher quase irreal de tão linda. Mulher irresistível com seu olhar, sorrir e caminhar. Essa mulher era Claudette Orbison, a própria esposa de Roy.

Roy Orbison com o amigo Bill Dees.
Roy Orbison estava em sua casa com seu amigo e compositor Bill Dees quando Claudette pediu dinheiro a Roy dizendo a ele que iria fazer compras. Bill Dees fez um disfarçado galanteio dizendo que “Mulher linda não precisa de dinheiro para fazer compras...” Roy disse a Bill que aquela frase poderia resultar numa canção. Claudette demorou 40 minutos e ao retornar Roy e Bill haviam composto “Pretty Woman”. A música levou uma semana para ser arranjada por Fred Foster, diretor artístico da pequena gravadora Monument Records, sendo gravada em 1.º de agosto. Distribuída no final desse mês, em setembro “Pretty Woman” desbancou “The House of the Rising Sun” (The Animals) que estava em primeiro lugar no Billboard. “Pretty Woman” permaneceu por três semanas no topo da lista dos discos mais vendidos, totalizando 14 semanas entre as Top-20. Ao final do ano a Monument Records contabilizou sete milhões de cópias vendidas de “Pretty Woman”. No Reino Unido Roy Orbison conseguiu a proeza de ser o artista não-britânico que quebrou, com “Pretty Woman”, a hegemonia dos cantores e grupos ingleses que há 68 semanas se revezavam na liderança do hit parade.


O vídeo acima mostra uma participação especial de Roy Orbison na série
*The Dukes of Hazzard", que no Brasil foi exibida como "Os Gatões".
Ao final de alguns episódios um grande nome da música country interpretava um
sucesso na taverna "Ninho do Javali". Por ali passaram Willie Nelson, Loretta Lynn
e muitos outros. Ao lado de Roy está uma verdadeira 'pretty woman', a atriz
Catherine Bach, a 'Daisy Duke' que encantava a pequena Hazzard.

Nascida em 1941, Claudette Frady acompanhava Roy Orbison em seus shows desde que tinha 16 anos. Mais velho que ela cinco anos, Roy e Claudette se casaram em 1958 e foi nesse ano que ela se tornou mais conhecida que o marido. Foi quando a dupla The Everly Brothers alcançou o primeiro lugar  do hit parade com o single “All I Have to do is Dream”, cujo lado B era a música “Claudette”. Essa deliciosa canção foi composta por Roy Orbison que, ainda pouco conhecido como cantor, preferiu entregá-la aos irmãos Don e Phil Everly. Depois de um começo de carreira difícil, especialmente porque o envergonhado Roy Orbison não possuía a boa pinta de Elvis, Ricky Nelson, Pat Boone e outros, Orbison estourou com “Only the Lonely”, em 1959, ganhando seu primeiro disco de ouro pelo milhão de cópias vendidas. Em 1961 Roy fez ainda mais sucesso com “Running Scared” e “Crying”. Mas seu estilo diferente de cantar mesclando sua voz de tenor com o uso primoroso de falsetes, interpretando canções de amor angustiadas, fizeram de Roy um grande ídolo na Inglaterra. E foi numa dessas tournês que Roy fazia na Inglaterra, confiando que Claudette estava tomava conta direitinho dos três filhos, que aconteceu uma infidelidade da esposa do cantor. Claudette estava incumbida também de comandar a construção de uma bela casa em Hendersonville, no Tennessee. Ela levou tão a sério a tarefa que acabou se envolvendo com o construtor, com quem teve um caso que chegou ao conhecimento do marido. Claudette já havia anteriormente tido outros amantes nas ausências de Roy, mas o caso com o construtor acabou em divórcio. A separação ocorreu em novembro de 1964, paradoxalmente quando “Pretty Woman” era cantada no mundo inteiro.

Roy Orbison e Claudette, sua bonita e pouco fiel esposa.

Roy Orbison tinha paixão por automóveis e por motocicletas. Em 1965 o cantor estava na Inglaterra quando sofreu um acidente de moto indo parar num hospital com o tornozelo fraturado e a perna engessada. Enquanto convalescia Roy recebeu a visita de Claudette no hospital e decidiram voltar a viver juntos, casando-se mais uma vez. Em 1966 Roy e Claudette passeavam de motocicleta quando a máquina em que ela estava foi atingida por um caminhão. A queda foi fatal para Claudette que faleceu nos braços do marido em 6 de julho de 1966. Mais ainda do que a canção “Claudette”, a esposa de Roy o inspirou para compor e cantar o maior sucesso de sua vida que foi “Pretty Woman”. Outra tragédia marcaria a vida do viúvo Roy Orbison quando, em 1968, sua casa se incendiou matando seus dois filhos mais velhos, escapando apenas o filho menor. Roy vendeu o que restou da casa para Johnny Cash. Em 1969 Roy se casou novamente. A nova esposa era uma jovem alemã de 21 anos chamada Barbara Jakobs, com quem Roy teve dois filhos e com quem viveu até falecer aos 52 anos em 1988. Barbara, por sua vez, faleceu em 2011, aos 60 anos de idade.

Acima Roy na infância, na adolescência e no início de carreira. Abaixo em duas fotos com
Claudette. Na foto maior está Barbara Orbison e os dois filhos que Roy teve com ela.

Bill (William Marvin) Dees, o amigo e letrista de Roy Orbison em quase uma centena de canções, entre elas “Pretty Woman”, faleceu em 2012, aos 73 anos. Bill Dees compôs com Roy “It’s Over”, outro grande sucesso de Orbison, além de canções interpretadas pelos mais famosos cantores da country music. Não se sabe quem fez o que em “Pretty Woman”, mas como autor dos versos da pequena historinha da moça que sai para passear, certamente a beleza de Claudette Orbison deve ter inspirado não apenas o marido, mas também o amigo Bill Dees. Roy Orbison começou sua carreira de cantor na Sun Records, ao lado de Elvis Presley, Carl Perkins e Jerry Lee Lewis que também começaram suas carreiras ali, guiados por Sam Phillips. Não conseguindo sucesso na Sun Records, Roy Orbison assinou contrato com a Monument Records, onde seu talento explodiu e ele vendeu bastante e ganhou muito dinheiro. Em 1967 Orbison assinou um contrato muito vantajoso com a MGM Records, com a promessa de fazer filmes, assim como Elvis vinha fazendo. O único filme que Orbison fez como ator foi “A Guitarra Mais Rápida do Mundo”, que poderia ser chamado também de ‘o fracasso mais rápido do mundo’.

Roy Orbison e Bill Dees segurando um dos muitos prêmios recebidos pelo sucesso de
"Pretty Woman". À direita Bill Dess pouco antes de falecer. Abaixo Carls Perkins,
Jerry Lee Lewis, Roy Orbison e Johnny Cash, lendas do rock 'n' roll que iniciaram suas
carreiras na Sun Records, tendo como colega Elvis Presley. 

Após deixar a MGM Records, Roy Orbison passou por diversas gravadoras, não conseguindo mais se reencontrar com o sucesso, o que só aconteceria no final de sua vida. Quando os Beatles e Roy Orbison excursionaram pela Inglaterra juntos, em 1963, na primeira noite, após se apresentarem, os quatro jovens músicos de Liverpool ficaram extasiados durante todo o show de Roy, assistindo e imaginando como um homem podia cantar como ele. Roy Orbison sempre teve muitos admiradores, alguns deles celebridades do mundo da música, gente como Bruce Springsteen, os Bee Gees, Bono Vox, Bob Dylan e muitos outros. Quando eles começaram a falar da influência que sofreram de Orbison, ou da admiração pelo cantor de “Crying”, as novas gerações passaram a prestar mais atenção em Orbison. Barry Gibb chegou a dizer que "...se Deus tivesse que ter uma voz essa voz seria a de Roy Orbison". Em 1988 foi formado o quinteto chamado The Traveling Wilburys (Orbison, Bob Dylan, George Harrison, Jeff Lynne e Tom Petty). Pretendendo apenas se divertir, gravaram um disco antológico que ganhou diversos prêmios e ficou um ano entre os álbuns mais vendidos. Adivinhem qual voz se sobressai entre todas ouvidas no disco?

Acima The Traveling Wilburys: Bob Dylan, Jeff Lynne, Tom Petty, George Harrison e Roy Orbison.
Abaixo no show "Black and White" Roy está acompanhado por James Burton, Jerry Scheff,

 Jackson Browne, Ronnie Tutt (bateria), Bruce Springsteen, T Bone Burnett e
 Elvis Costello, um timaço de fãs de Orbison homenageando seu ídolo.

O cinema também ajudou na (re)descoberta de Orbison, a partir de “Veludo Azul”, em que os dopadíssimos Dean Stockwell e Dennis Hopper ouvem “In Dreams”, numa sequência felliniana criada pelo diretor David Lynch. E finalmente em 1990 Hollywood iria assistir ao conto de fadas moderno intitulado “Uma Linda Mulher” (“Pretty Woman” no original), embalado pela vibrante canção cantada por Roy Orbison. Milhões de vezes, em todos os cantos do mundo, o riff de “Pretty Woman” introduzia a voz inconfundível e admirável de Roy Orbison, com direito a grunhido e gargarejo, coisa que nenhum cantor faria sem cair no ridículo. Com o sucesso estrondoso do filme estrelado por Julia Roberts e Richard Gere, Roy Orbison voltou a gravar, a se apresentar mais vezes e a vender muitos discos novamente. “Mistery Girl”, seu último álbum gravado em 1988, é o melhor de sua carreira, tendo a impecável produção de Jeff Lynne e é verdadeiramente antológico. É o disco que contém “You Got It”, a música preferida por nove entre dez publicitários e tantas vezes usada em propagandas. Tudo indicava que Roy Orbison faria muitos outros discos para emocionar os amantes da boa música. Porém em 6 de dezembro de 1988, após passar o dia brincando de aeromodelismo com seus filhos e após ter jantado com sua mãe em Hendersonville, o coração de Roy Orbison parou de funcionar. Roy sofreu um fulminante ataque cardíaco, falecendo aos 52 anos. A melhor frase sobre Roy Orbison pode ser aquela expressa por Elvis Presley: “Roy Orbison, e não eu, é o grande cantor do rock ’n’ roll”.

Fotos de encontro de Roy Orbison com os Beatles em 1963: Claudette Orbison dá uma
colherada a John Lennon enquanto o marido, o filho e Ringo observam; George Harrison
conversa com Roy; Lennon alimentando Roy, com Ringo Starr ajudando.


Participação especial de Roy Orbison em episódio da série "The Dukes of Hazzard".
Roy com Catherine Bach (Daisy Duke), Denver Pyle (Uncle Jesse Duke).
Sorrell Booke (Boss Hogg, o prefeito de Hazzard) aplica uma multa em Roy.

domingo, 7 de abril de 2013

“BLUE MOON” – THE MARCELS


O quinteto vocal The Marcels entrou no dia 15 de fevereiro de 1961 no estúdio da gravadora Colpix, braço da Columbia Records para artistas novos. Havia pouco tempo para The Marcels gravar seu primeiro compacto-simples com as músicas “Goodbye to Love” e “Zom, Zom, Zom”. Antes de começar a cantar, o The Marcels costumava fazer um aquecimento vocal com uma versão própria da clássica canção “Blue Moon”, de Richard Rogers e Lorenz Hart. E fizeram isso no estúdio, de um jeito peculiar que deixava a canção praticamente irreconhecível. O produtor Stu Phillips gravou “Goodbye to Love” mas não gostou do ensaio de “Zom, Zom, Zom”. Restavam apenas dez minutos do tempo reservado para a gravação e Stu sugeriu que os cinco rapazes gravassem uma música chamada “Heart and Soul”. Acontece que o The Marcels não conhecia “Heart and Soul” e propuseram gravar “Blue Moon” do jeito que eles usavam como aquecimento. Stu Phillips concordou até porque não havia tempo para mais ensaios. Foram feitos dois registros da gravação de “Blue Moon” pelo The Marcels.





Stu Phillips, diretor artístico da Colpix Records que produziu "Blue Moon" com The Marcels.

Um funcionário da Colpix ficou impressionado com o que ouviu e autorizado por Stu Phillips levou o acetato para o disc-jóquei Murray Kauffman, da rádio WINS. Kauffman tinha um programa radiofônico que começava à noitinha e se prolongava até o fim da madrugada e no início do programa tocou “Blue Moon” com The Marcels. O telefone da rádio não parou mais de tocar solicitando a repetição daquela gravação e Kauffman teve que tocar “Blue Moon” 26 vezes noite adentro. No dia seguinte todas as lojas de Nova York faziam pedidos do primeiro disco do The Marcels. A Colpix se apressou em editar a gravação e lançou o compacto no final de março, com “Blue Moon” entrando em 18.º lugar na lista dos 40 discos mais vendidos. No dia 3 de abril a gravação do The Marcels assumiu o primeiro lugar do hit-parade, desbancando “Surrender”, com Elvis Presley. “Blue Moon” ficou três semanas em primeiro lugar e um total de nove semanas entre as mais vendidas nos Estados Unidos. Na Inglaterra “Blue Moon” também atingiu o topo dos discos mais vendidos se transformando num grande sucesso.


Murray 'The K' Kauffman, o disc-jóquei que tornou famosa a gravação do The Marcels.

Mas nem tudo foi tão fácil para a espetacular carreira de “Blue Moon” pois Richard Rogers detestou o que The Marcels fez com sua música. O compositor publicou anúncios nos jornais pedindo para que ninguém comprasse aquele disco. Claro que o efeito foi exatamente o contrário, para desespero de Richard Rogers pois sua clássica canção tocava em todo lugar. “Blue Moon” foi composta por Richard Rogers e Lorenz Hart em 1933 e foi chamada primeiro de “Make me a Star” e depois de “The Bad in Every Man”. Finalmente, em 1935 recebeu novos versos e o título definitivo, sendo gravada por praticamente todos os grandes cantores norte-americanos, antes e depois da gravação do The Marcels. Billie Holliday, Bing Crosby, Frank Sinatra, Elvis Presley, Bob Dylan, Cliff Richard e Rod Stewart, entre outros gravaram “Blue Moon” que fez sucesso na voz de Mel Thormé, antes do The Marcels. “Blue Moon” fez parte da trilha musical de “Minha Vida é uma Canção”, de 1948, filme em que Mickey Rooney interpreta Lorenz Hart e Tom Drake é Richard Rogers. “Blue Moon” foi ouvida depois em 1949, em “Malaia” (com Spencer Tracy e James Stewart); em 1950 em “Mundos Opostos” (com Barbara Stanwyck); e em 1952, no filme “Meu Coração Canta” (com Susan Hayward). Em 1981 o cinema voltou a usar a “Blue Moon” no filme de John Landis “Um Lobisomem Americano em Londres”, ouvida na abertura na voz de Bobby Vinton e nos créditos finais com a gravação do The Marcels.


Rogers e Hart na capa da revista Time; Mickey Rooney interpretando Lorenz Hart ao lado de
Judy Garland, no musical da Metro "Minha Vida é uma Canção" (Words and Music).

Na década de 50, nos Estados Unidos, havia quase tantos grupos vocais quanto cantores e cantoras solos. The Marcels, de Pittsburgh, Pensylvania, era apenas mais um deles, com uma característica especial: era um grupo vocal interracial formado pelos negros Cornelius ‘Nini’ Harp, Ronald ‘Bingo’ Mundy e Fred Johnson e pelos brancos Gene Bricker e Richard Knauss. O repertório do The Marcels era todo composto por rhythm & blues, na esteira do sucesso de cantores como Fats Domino com seus hits “My Blue Heaven” e “Blueberry Hill”. O nome do grupo era uma referência a um tipo de penteado que andou em voga nos anos 40, chamado de ‘marcel’. Após o sucesso de “Blue Moon”, o grupo The Marcels gravou três compactos e um LP, que não venderam bem. Mesmo recriando a seu estilo canções famosas como “Over the Rainbow”, “Summertime” e “You Are My Sunshine”, The Marcels só era lembrado por “Blue Moon”. Foi quando os dois brancos do quinteto deixaram o grupo e Fred Johnson trouxe seu irmão Allen Johnson (barítono). Walt Maddox, outro negro completou o grupo, agora formado só por coloreds.


Acima a primeira formação do The Marcels, com Richard Knauss, Ronald 'Bingo' Mundy,
Gene Bricker, Fred Johnson e Cornelius 'Nini' Harp. Abaixo a segunda formação, sem os
brancos Richard Knauss e Gene Bricker, substituídos por Allen Johnson e Walt Maddox.

Em 1961 os membros do The Marcels participaram do filme “Dançando o Twist”, estrelado por Chubby Checker e Dion DeMucci. Nos anos seguintes ocorreram várias trocas de vocalistas e o repertório do The Marcels continuava fazendo novas versões de stardards como “That Old Black Magic”, “How Deep is the Ocean” e “In the Still of the Night”. The Marcels mudou de gravadora e trocou várias vezes de formação, mas nada disso trouxe de volta o sucesso conhecido com “Blue Moon”. E é essa música que prolongou por quase 50 anos a vida do grupo, apresentando-se para plateias que aplaudiam a afinação dos cinco senhores e esperando pelo momento de ouvir a famosa canção de Rogers & Hart. Daquele jeito que só The Marcels, com o mesmo Fred Johnson fazendo o fantástico e inconfundível baixo.